sábado, 25 de outubro de 2014

TAM-TAM-TARAM TAM-TAM-TAM



          Nunca foi outro o sonho dela: casar. Desde o primário, entre os coleguinha, fazia a cotação dos meninos para futuro noivo. Espantou dezenas de namorados com a tal ideia fixa de casamento, já no primeiro encontro. E se imaginava sempre: toda de branco, com um vestido deslumbrante, flor de laranjeira na cabeça, de braço dado com o pai a entrar na igreja vagarosamente ao som daquela consagrada marcha nupcial . E todos no altar, boquiabertos com sua figura - inclusive algumas amigas falsas que tivera, que ficariam roxas de inveja. E via a igreja toda enfeitada com rosas brancas...ou lírios, ou, quem sabe, camélias - não tinha decidido ainda. Mas haveria de ser o seu momento. Uma perfeição de conto de fadas. Só faltava o noivo. E nenhum era bom o bastante. Mas, um dia, já na faculdade, reconheceu num estudante de arquitetura o tão sonhado esposo. Ambos de família abastada, não economizaram na celebração. Na igreja mais imponente, a decoração perfeita, o melhor salão, um bolo de revista, sete damas de honra e sete padrinhos, viagem de lua-de-mel na Europa e o escambal : um sonho. Ao som dos tam tam tam tans de Mendelssohn, ela entrou visivelmente emocionada. O vestido, branco e rendado, de corpete bem justo, acentuava sua cintura já muito fina. De fato, uma aparição. Todos ficaram bestificados com a beleza da noiva. Finda a cerimônia, dirigiram-se para o salão de festas. Os canapés agridoces fizeram sucesso entre os convidados que não acharam em quê por defeito.  Desde a valsa, porém, a noiva parecia estranha. Mas, no tumulto da festa, ninguém deu reparo. Ela trancou-se no banheiro e chorava desesperadamente. Era o momento mais esperado de sua vida. E, num instante acabou, entende? Assim, banalmente, estupidamente, cumpriu-se o script e pronto?! Tanta expectativa para isso???
A ausência da noiva começou a ser notada e, quando uma das madrinhas foi buscá-la para jogar o buquê, encontrou-a no banheiro enforcada com o véu do vestido. No espelho, escrito de batom, um adeus patético e enigmático ao noivo:


"Amor, me perdoe. Passei anos da minha vida construindo um castelo e agora ele ruiu ..."

Foi enterrada vestida de noiva mesmo. No jazigo da família, onde a escultura de um anjo nu fazia sombra, sob o mármore antigo ela teve, enfim, a concretude do seu sonho.

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