sábado, 25 de outubro de 2014

O OLIVEIRA

          Corretíssimo. Organizadíssimo. Pontualíssimo.O relógio de ponto da  empresa em que trabalhou , que o diga. Funcionário exemplar que foi, por trinta anos  no mesmo cargo de auxiliar administrativo, nunca faltou ao trabalho uma única vez. O chefe se assombrava:  "Homem, tire uns dias de folga: amanhã é o seu casamento". Mas, ele, irrepreensível:  "Caso no civil de manhã, Seo Martinelli ; à tarde, torno ao batente.Algumas horas de dispensa do serviço, me bastam" Cioso das menores falhas.Exímio cumpridor dos deveres. Honrava os compromissos com muito rigor. Quando não - por inevitável contratempo- passava em  claro as noites, pensando. A mulher enlouquecia. Os filhos fugiam. Em casa, era um general: exigia que tudo funcionasse em tempo cronometrado. Enfim, aposentou-se. Tendo trabalhado desde cedo, a aposentadoria por tempo de serviço não veio encontrá-lo tão velho. Sem contar que, talvez pelos excelentes e regulares hábitos, ou por simples predisposição, tinha uma saúde de ferro.  
          A conselho de amigos, parentes e colegas, ia fazer a primeira grande viagem. Um cruzeiro (internacional). Pra quem quase não punha o nariz fora da própria cidade, hein! Ele estava radiante. Já tinha dado entrada no processo da aposentadoria. Comprara a passagem. A mulher havia feito as malas e, na véspera de partirem, enquanto jantavam e riam - e ele, ele que nunca ria,caramba, mas riu - E riam, imaginando as peripécias da viagem, o infeliz engasgou com um caroço de azeitona. Tossiu, tentou cuspir, bebeu água, ergueu os braços, mas não teve jeito. Quando a esposa voltou com a ajuda, que por fim , aflita, foi buscar, encontrou-o roxo, já rígido e frio. Morrer; morrer engasgado com um caroço de azeitona. "Um homem tão sério, tão trabalhador, morrer numa presepada dessas." - lamentava o irmão mais velho. Todos estavam inconformados no velório. A viúva, em estado de choque, soluçava enquanto segurava um vidro de azeitonas em conserva sem caroço, que encontrara esquecida na despensa pouco depois do incidente.

          Na nota de obituário, no jornal da cidade,  imprimiu-se uma singela homenagem: "Descanse em paz, saudoso amigo Justo Oliveira" - era esse o nome dele.

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