sábado, 25 de outubro de 2014

RICARDO

          Firme, ele segue  para mais um encontro. Perfumado e de cabeça erguida; a barba feita, as unhas cortadas, as meias limpas, sapatos novos e um coração enxovalhado...
Não tinha nada de Ricardão. Não era forte nem muito alto. Magro,sem ser atlético. Rato de biblioteca. Mas não usava óculos, não - que eu tenho horror a estereótipos fáceis.
Começou no tempo da escola:

          A professora de história era tão bonita. Como é que ninguém dizia isso a ela? Que olhos, que cabelos! Ele poderia ficar o dia inteirinho olhando pra ela, de boca aberta, com cara de bobo. Se ela fosse uma obra de arte, La Pietá ficaria desfalcada porque o próprio Cristo se renderia pra ficar junto dela. Um dia ele se encheu de coragem:

           - Professora a senhora parece...
           - O quê, Ricardo?
           - Alguém igual a senhora...

           E a classe caiu na gargalhada. 

         Achou melhor se declarar no papel, e soltar o verbo depois. Foi quando nasceram os primeiros versos. Promissores para a idade. Neles, sua musa era chamada de deusa, e  comparada à Helena de Troia, cuja beleza causou uma guerra. Mas nunca mostrou a ninguém o primeiro poema. Nem o seguinte. E assim, seus armários se abarrotavam de amores engavetados.

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